Câncer da Boca: Papel do Dentista

Câncer da Boca: Papel do Dentista

700O carcinoma de células escamosas (CEC) da boca, também denominado carcinoma epidermóide, carcinoma escamocelular e carcinoma espinocelular, é uma neoplasia maligna que se origina no epitélio de revestimento, sendo considerada a neoplasia maligna mais comum desta região.

O câncer da boca é um importante problema de saúde pública no mundo, figurando entre as 10 neoplasias malignas mais prevalentes (para o ano de 2010 a estimativa era de 14120 novos casos no Brasil) e apresentando a maior taxa de mortalidade dentre os cânceres da região de cabeça e pescoço. Dados do Instituto Nacional do Câncer, em 2010, revelam que o câncer de boca foi o 5º mais incidente em homens e o 7º entre as mulheres.

O grupo de risco para o câncer de boca é composto principalmente por indivíduos do sexo masculino, com 40 anos ou mais, usuários do tabaco em suas mais variadas formas e de bebidas alcoólicas (cerca de 87% dos pacientes relata tabagismo e etilismo)2. É importante ressaltar que, apesar de as mulheres não constituírem esse grupo, nas últimas décadas, o seu comportamento social tem-se transformado por meio da adoção de hábitos tabagistas e etilistas, o que permite a inclusão do sexo feminino no grupo de risco do câncer de boca1.

A etiologia do câncer bucal é multifatorial, sendo composta por fatores endógenos, como a predisposição genética, e fatores exógenos ambientais e comportamentais, como uso do tabaco, ingestão de bebidas alcoólicas, exposição à radiação solar e produtos químicos carcinogênicos3,4.

O câncer pode ser definido como uma multiplicação desordenada de células defeituosas ou atípicas, que não conseguem ser eliminadas pelo sistema imunológico, por razão ainda desconhecida. Na boca a localização anatômica mais frequente do câncer é a língua5, embora alguns autores considerem a maior prevalência em região de soalho bucal6,7.

A ausência de sintomatologia da doença na fase inicial, a falta de preparo do cirurgião-dentista e a falta de recursos dos serviços de saúde aliada ao medo e a falta de informação da população são fatores que podem estar associados ao diagnóstico tardio da doença. O cirurgião-dentista exerce um papel primordial na prevenção do câncer de boca, principalmente quando atua nos níveis de prevenção primária e secundária, ao propor ações que facilitem o reconhecimento dos indivíduos pertencentes ao grupo de risco e ao realizar práticas que busquem diagnosticar precocemente as lesões suspeitas.

A prevenção primária do câncer de boca consiste fundamentalmente em programas e medidas de combate ao consumo de tabaco e bebidas alcoólicas. O exame físico da boca para detecção precoce de lesões cancerizáveis e tumores não sintomáticos é uma estratégia de prevenção secundária, a partir da qual se espera viabilizar o diagnóstico da doença em seus estágios iniciais e, assim, possibilitar um melhor prognóstico por meio da pronta e efetiva intervenção terapêutica7. A detecção da doença não deveria oferecer dificuldades, tendo em vista o fácil acesso à cavidade bucal e simplicidade no tocante à realização do exame da boca. O diagnóstico precoce pode ser estabelecido durante a fase pré-neoplásica ou em fases incipientes de evolução da doença, nas quais as chances de cura aproximam-se de 100% (leucoplasia, eritoplasia, carcinoma “in situ” e carcinoma microinvasivo). Para essa detecção, é necessário realizar o exame físico, que poderá ser confirmado pelo histopatológico e, por essa razão, um atraso durante a detecção pode resultar em um aumento de ocorrência de diagnóstico em estágios avançados8,9. De acordo com Kowalski e colaboradores8, deve-se buscar identificar os indivíduos de alto risco (homens com mais de 40 anos, sobretudo se tabagistas e/ou etilistas) e estimular a se submeterem a exames periódicos anuais. Nesse contexto, o profissional poderá contribuir para o diagnóstico precoce do câncer bucal e, por conseguinte, para o sucesso em relação ao seu tratamento10,11. Fatores de risco, incidência, diagnóstico precoce, autoexame, tipos e técnicas de biópsia, modalidades de tratamento e reabilitação são questões que devem ser cada vez mais incorporadas ao cotidiano do cirurgião-dentista12.

O cirurgião-dentista precisa sair da faculdade preparado para agir como agente transformador, capaz de perceber a realidade e enfrentá-la por meio de ações que associem a teoria à prática12. Entretanto, os acadêmicos dos cursos de Odontologia em função da limitada experiência clínica ou do pouco conhecimento dos aspectos relacionados às lesões cancerizáveis e neoplasias malignas bucais revelaram-se despreparados para reconhecer os sinais e sintomas e fatores de risco relacionados ao câncer bucal13. Por esse motivo, a reciclagem profissional e o ensino da oncologia, nas escolas médicas e odontológicas, com ênfase na prevenção e no diagnóstico de lesões cancerizáveis, são fundamentais à redução dos indicadores de morbimortalidade14.

1. Instituto Nacional do Câncer (INCA/MS) [homepage na internet]. Estimativa de incidência de câncer no Brasil. [acesso em agosto 2007]. Disponível em: http://www.inca.gov.br

2. Brener S, Jeunon FA, Barbosa AA, Grandinetti HAM. Carcinoma de células escamosas bucal: uma revisão de literatura entre o perfil do paciente, estadiamento clínico e tratamento proposto. Revista Brasileira de Cancerologia. 2007; 53(1): 63-69.

3. Lima AAS, França BHS, Ignácio AS, Baioni CS. Conhecimento de alunos universitários sobre câncer bucal. Rev Bras Cancerologia. 2005; 51(4):283-8.

4. Mahboubi E, Sayed GM. Oral cavity and pharynx. In: Schottenfeld D, Fraumeni Jr. JF, editors. Cancer epidemiology and prevention. 2 ed. New York: Oxford University Press; 1996. p. 583-95.

5. Dedivitis RA, França CM, Mafra ACB, Guimarães FT, Guimarães AV. Características clínico-epidemiológicas no carcinoma espinocelular de boca e orofaringe. Rev Bras Otorrinolaringol. 2004;70(1)35-40.

6. Franco EL, Kowalski LP, Oliveira BV, Curado MP, Pereira RN, Silva ME, et al. Risk factors for oral cancer in Brazil: a case-control study. Int J Cancer. 1989;43(6):992-1000.

7. Velly AM, Franco EL, Schlecht N, Pintos J, Kowalski LP, Oliveira BV, et al. Relationship between dental factors and risk of upper aerodigestive tract cancer. Oral Oncol. 1998; 34:284-91.

8. Antunes JLF, Toporcov TN, Wünsch-Filho V. Resolutividade da campanha de prevenção e diagnóstico precoce do câncer bucal em São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica; 2007; 21(1):30–6.

9. Ries L, Kosary CL, Hankey et al. SEER Cancer Statistics Review, 1973–1995. Bethesda, MD, NCI.2. American Cancer Society, Facts and Figures, 2000.

10. Kowalski LP. Carcinoma da boca: epidemiologia, diagnóstico e tratamento. Acta AWHO. 1991;10(3):128-34.

11. Syme SE, Drury TF, Horowitz AM. Maryland dental hygienists’ knowledge and opinions of oral cancer risk factors and diagnostic procedures. Oral Diseases. 2001; 7: 177–84.

12. Rodrigues TLC, Costa LJ, Sampaio MCC, Rodrigues FG, Costa ALL. Leucoplasias bucais: relação clínico-histopatológica. Pes Odontol Bras. 2000;14.(4):357-61.

13. Parajara F. Enfrentando o câncer bucal. Rev. APCD. 1999; 53(5):353-60.

14. Thomaz EBAF, Cutrim MCFN, Lopes FF. A importância da educação como estratégia para prevenção e diagnóstico precoce do câncer bucal. Acta Oncologica Brasileira. 2001.

15. Kowalski LP, Magrin J, Riera C, Coelho FR, Zeferino LC. Modelo de programa de prevenção e detecção precoce do câncer bucal. Saúde debate. 1991;(32): 66-71

 

Autor:Dra. Sylvie Brener
CRO 22233Dentista da Clínica Oncocentro BH

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