Rastreamento em Câncer de Pulmão

O câncer de pulmão é o segundo tumor de maior incidência em todo o mundo e o que mais conduz ao óbito. Além disto, as mortes relacionadas aos tumores de pulmão têm aumentado em proporções epidêmicas, refletindo a clara relação desta doença com o tabagismo. A prevenção, mais do que o rastreamento precoce da doença, é a estratégia mais efetiva para reduzir o número de casos e óbitos relacionados aos tumores pulmonares.

Infelizmente, cerca de 75% dos casos de neoplasias pulmonares apresentam-se com sintomas relacionados a doença avançada, seja no pulmão ou com disseminação a distância (metástases), onde a possibilidade de cura é remota ou inexistente. 

Apesar do claro avanço no tratamento do câncer de pulmão  nos últimos anos, a sobrevida a 05 anos é de apenas 16% somando-se todos os estágios da doença. Entretanto, o diagnóstico precoce é essencial para que os pacientes apresentem uma maior chance de cura. Tumores que são diagnosticados no estágio I apresentam taxa de sobrevida de 60% em 05 anos, ao passo que, tumores em estágio IV apresentam taxa de sobrevida de menos de 5% em 05 anos.

O objetivo do rastreamento é identificar pessoas assintomáticas com doença não previamente diagnosticada (em geral um nódulo pulmonar) além de reconhecer pacientes com o risco aumentado (tabagismo, história familiar ou ocupacional). Isto significa que, diagnosticando um nódulo pulmonar em fase inicial este poderia ser tratado com intensões curativas, ao contrário de uma doença diagnosticada tardiamente. O teste ideal de rastreamento deve ter: alta sensibilidade para detectar uma doença em fase inicial, ser específico para a doença em questão, ser seguro, ser acessível para pacientes e médicos, ser de relativo baixo custo e o mais importante, capaz de reduzir a mortalidade e melhorar a qualidade de vida.

Rastreamento com Radiografia do Tórax:

Desde a década de 60, vários estudos controlados foram publicados com o intuito de demonstrar ganhos de sobrevida naquelas pessoas de risco para câncer de pulmão e submetidas a radiografia do tórax anual ou bi-anual. Entretanto, nenhum destes estudos evidenciaram um aumento na sobrevida daqueles pacientes diagnosticados precocemente com a doença.

Rastreamento com Radiografia do Tórax e citologia do escarro:

Dois grandes estudos americanos, ambos realizados nas décadas de 80 e 90, rastrearam uma população de risco para câncer de pulmão, para fazerem radiografia de tórax anual, além de duas coletas anuais do escarro. Sabe-se que pacientes portadores de neoplasias pulmonares podem apresentar presença de células da doença nas secreções bronco-pulmonares. Estes estudos também não mostraram redução da mortalidade do câncer quando se acrescentou a análise do escarro a radiografia do tórax.

Rastreamento com Radiografia do Tórax e citologia do escarro realizados com maior frequência:

Um importante estudo realizado pela Clínica Mayo, nos Estados Unidos, envolveu mais de 10.000 homens fumantes. Os pacientes foram divididos em dois grupos: o primeiro para fazer radiografia do tórax e citologia do escarro a cada 4 meses e o outro grupo para radiografia do tórax anual. Após um seguimento de 6 anos dos pacientes em ambos os grupos, foram detectados 206 novos casos no primeiro e 160 no segundo (grupo controle). De maneira significativa, um maior número de casos iniciais da doença foi detectado com o rastreamento mais intensivo, mas não houve diferença na detecção de tumores em estágio avançado. Curiosamente, na literatura mundial não há uma clara explicação do porquê os estudos de rastreamento em câncer de pulmão mostram uma maior detecção de casos iniciais mas falham em demonstrar redução de mortalidade.

Rastreamento com Tomografia Computadorizada (TC) do Tórax:

Com o advento de novas aparelhos de tomografia computadorizada com significativa baixa emissão de radiação, novos estudos utilizando esta técnica começaram a ser produzidos a partir do ano de 2002. Recentemente, um dos mais importantes estudos neste cenário foi publicado. O National Lung Screening Trial (NLST) incluiu mais de 50.000 pacientes de alto risco de desenvolver câncer de pulmão. Estes foram alocados para fazer tomografia de tórax anualmente durante três anos ou radiografia do tórax no mesmo período. Como conclusão, observou-se redução da mortalidade em câncer de pulmão na ordem de 20%.  O estudo NSLT foi o primeiro estudo a demonstrar, de maneira inequívoca, a vantagem de se realizar o rastreamento para detecção precoce do câncer de pulmão. Entretanto, a TC de baixa emissão de irradiação é um exame de alto custo e estudos de custo-efetividade mostram que as campanhas de estimulo a suspensão ao fumo, com a distribuição de adesivos de nicotina e medicamentos específicos, são de menor custo e a longo prazo podem promover uma diminuição significativa de novos casos da doença.

Consideraçòes Finais:

Até o momento, nenhuma sociedade médica internacional corroborou o rastreamento com TC tórax, até que novas análises definam se apenas o grupo de alto risco deve realizar o exame. Não há dados do beneficio deste rastreamento para pessoas de médio ou baixo risco, tais como os fumantes passivos ou com exposição ocupacional. Além disso, análises cuidadosas de custo-efetividade tem que ser feitas de maneira individualizada, antes de implementar como rotina, especialmente nos países em desenvolvimento.

Em conclusão, a mais poderosa intervenção capaz de prevenir a morte e as complicações do câncer de pulmão é a descontinuação do hábito de fumar.

Bibliografia:
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Autor:Dr. Igor A. Protzner Morbeck
CRM DF 12.068RQE 9308Oncologista Clínico – Onco-Vida  – Brasília-DF
Mestre em Ciências – AC Camargo – São Paulo – SP
Professor Medicina Interna da Universidade Católica de Brasília
Diretor do Centro de Estudos e Pesquisas Oncológicas do Distrito Federal (CESPO)

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